Um dia. Na grama seca do quintal de sua casa não menos seca, apareceu um punhado de flores amarelas.
Arrancou-as todas sem dó.
Tirou cada uma de suas pequeninas pétalas e as guardou num copinho de plástico velho.
A vida tinha lhe pedido perdão.
Mas veio tarde demais.
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domingo, 30 de junho de 2013
domingo, 9 de junho de 2013
As três mulheres do adeus
Não eram bonitas. Tampouco elegantes. Mas eram
amigas e isso lhes bastava. Andavam as três de mãos dadas, balançando os braços
e rindo alto. Trocavam olhares cúmplices, segredavam uma no ouvido da outra e
viviam assim, juntas. Carregavam no pulso uma pulseira dourada. Cada uma com as
iniciais das outras duas em pedrinhas de strass. Porque
brilhava bastante.
Costumavam sentar no meio-fio da calçada e
passavam a tarde numa morosidade de cochichos, carinhos e cochilos.
No entanto a vida – sempre ela, aliás
- tratou de separá-las.
A primeira, sem escolha, se mudou com a
família para uma cidade bem distante.
A segunda, sem muito querer, entrou na
universidade e, traidora, foi se engraçar com os estudos.
A terceira, por puro protesto, trancou-se
no quarto e dele não saiu nunca mais. Pendurou a pulseira ao lado da cama e se
convenceu de tê-la pendurado não por saudade. Era só pra vê-la brilhar no
escuro, repetia a si mesma todas as noites.
Em um dia triste, uma delas tomou coragem
e escreveu a suas amigas: tinha vontade de encontrá-las novamente.
Estabeleceu-se, assim, uma infinidade de
trocas de e-mails. Marcavam, desmarcavam, marcavam de novo. Por fim, o encontro
ficou combinado na cidade onde cresceram e continuava sendo o mesmo lugar da
terceira amiga que, por puro protesto, nunca a havia deixado.
O dia marcado, um domingo. E o encontro deveria
acontecer numa pracinha por onde tantas vezes caminharam. A hora: três horas.
Uma pra cada amiga, porque sempre muito bem souberam andar junto do tempo.
A primeira, então, se organizou toda para
a viagem: tingiu o cabelo, pintou as unhas e escolheu o vestido.
A segunda adiantou os estudos. Ia passar o
domingo sem olhar os livros.
E a terceira, trancada no quarto por puro
protesto, passou a manhã ensaiando a sua saída. Tirou a pulseira da parede e a
colocou no pulso, sem se importar com os pontos de ferrugem. Também nem se deu
conta de que já estava bem apertada. Reparou apenas no brilho dos strass. E nas
iniciais de suas amigas.
Então, às três horas de um domingo
qualquer numa pracinha da cidade, as três mulheres se reencontraram. E se
abraçaram por um tempo que só elas poderiam dizer. E riram das coisas antigas pois
das novas não sabiam rir. E andaram pela calçada balançando os braços. Sem dar
as mãos. Algumas coisas se perdem com o tempo e não há reencontro para
trazê-las de volta.
De repente a terceira, por puro protesto, ergueu
o braço e deu adeus a um carro que passou. Talvez só quisesse mostrar às outras
a pulseira guardada e lembrada para o reencontro. Ou, talvez, só quisesse mostrar
a si mesma a saudade de um tempo de pulseiras e iniciais.
As amigas, porém, pareceram não enxergar a
verdade por trás desse adeus. E elas riram e, sem muito pensamento, repetiram o
gesto a um outro carro. E a um outro. E a outro.
As três agora andavam lado a lado, os
ombros grudados e erguendo os braços para sempre, num adeus a todos pelo
caminho: carros, passantes, cachorros e pássaros, até.
E foi assim. Que as amigas se
reencontraram de fato. E enfim.
E foi assim. Que a terceira amiga, de
repente, viu sua pulseira arrebentar e rolar até a sarjeta. E não voltou para
tirá-la de lá. Sequer olhou para lá.
Nesta noite, ela decidiu dormir sem o
brilho das pedrinhas.
E estava tudo bem.
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